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Não se deixe aperrear!

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Temas da Longevidade

Não se deixe aperrear!


Sempre gostei muito da expressão aperrear. É uma expressão que caiu em desuso, muito pouco usada em meio urbano e ouvia-a mais na boca de mulheres que de homens. É uma palavra que encerra em si um conceito mais lato que o de inibição ou fecho da pessoa sobre si mesma, representa perda da pessoa em si mesma, perda de identidade, limitação do seu Eu. Quando alguém dizia “sinto-me aperreada” percebia-se que falava de um estado de si em que deixara de ser a pessoa que costumava ser. Trago este conceito à baila para falar de um estado da pessoa em que ela se perde numa clausura vazia sobre si própria, não se reconhece, impede-se de iniciativa, sente o seu Mundo menor que ela própria. Aperrear é antónimo de expandir, de se alargar na conquista de espaço, espaço físico subjetivo, abarcamos mais mundo, e espaço mental, capacidade de pensar e entender presente, passado e construir futuro. Podemos usar outra imagem muito popular como fechar-se ou sair da concha. Estes dois movimentos contrários aplicam-se à compreensão de muitos dos nossos estados de espírito. Vou dar dois exemplos de situações contrárias, o confinamento em casa e o deserto, em que em ambos os casos podemos viver estes dois estados de espírito. No confinamento podemos ficar aperreados em nossas casas, limitados a algumas tarefas domésticas, a eventual teletrabalho, a colocarmo-nos em frente à televisão ou a cochilar no sofá. Invade-nos um vazio desesperante, anulamo-nos como pessoa que somos. Interessa-nos brevemente uma ou outra ocupação, mas enfastiamo-nos da mesma. Temos pouca disponibilidade para os outros, perdemos a nossa criatividade e possível generosidade. Não conseguimos encontrar-nos a nós mesmos. O nosso pensamento é pobre e circular. Na melhor das hipóteses somos assaltados pela tristeza e por sentimentos de abandono. Mas, pode nem haver emoções ou instalar-se uma ansiedade que nos invade sem que saibamos de onde ela vem.

Ao contrário podemos instalar-nos em casa com projetos pessoais, desde estudar uma matéria até iniciar uma atividade que toda a vida gostaríamos de realizar e nunca tivemos oportunidade. Agarramos iniciativas com interesse ou até paixão e sentimo-nos preenchidos. Estamos abertos aos outros, ao Mundo, temos esperança e somos capazes de dar e receber, conseguimos construir e ser generosos. Sentimo-nos nós mesmos com confiança e não é o confinamento que nos impede de pensar e sentir.

Imagine-se na imensidão do deserto onde podemos estender os braços com vontade de abraçar não o Mundo, mas o Universo, ou ao contrário encolher-se com medo e aniquilar a alegria de se expandir. Não é a ocupação que impede que nos fechemos, é a forma como nos ocupamos, como agarramos a vida.

Acontece apercebermo-nos que não conseguimos sair do impasse de vazio e retração sobre nós próprios. Nesse caso peça ajuda.


“Quer aperrear-se ou agarrar a vida?”